Leia para um curumim
Dianne Melo, coordenadora da campanha Leia Para Uma Criança, do Itaú Social, respondeu a perguntas enviadas pelo editor da Quatro Cinco Um, Paulo Werneck, sobre o novo edital lançado em setembro.
Veja abaixo ou no site da Quatro Cinco Um.
Publicado originalmente em 01 de outubro de 2020.
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Fundação Itaú Social divulga novo edital do programa de distribuição gratuita de livros infantis
A Fundação Itaú Social divulgou em setembro o novo edital do programa de distribuição gratuita de livros infantis Leia Para Uma Criança. O programa chega aos dez anos de estrada com uma novidade: pela primeira vez, será direcionado especificamente a obras que retratem as culturas indígenas e as culturas negras do país.
As inscrições ficarão abertas até o dia 21 de outubro e serão exclusivas para editoras de livros para crianças de zero a seis anos, em primeira edição ou não. Autores indígenas e negros terão preferência na seleção, mas o critério não é eliminatório.
Hoje o Leia Para Uma Criança é provavelmente o responsável pelas maiores tiragens de um único título no Brasil. Em 2019 — ano em que o projeto conquistou o Prêmio Jabuti na categoria Fomento à Leitura —, Leo e a baleia, de Benji Davies, e O tupi que você fala, de Claudio Fragata, tiveram 1,8 milhão de exemplares impressos cada um, além de 5 mil cópias em braille. Para 2020, a fundação projeta a impressão de até 2 milhões de exemplares de cada livro selecionado — um sobre cultura indígena e outro sobre cultura negra —, além de 10 mil exemplares cada em braille.
A seleção tem o formato das tradicionais (e hoje raras) licitações governamentais para compra pública de livros, com diferentes etapas de avaliação técnica, jurídica, crítica e pedagógica. Assim como deve ocorrer nos governos das diferentes esferas, uma negociação especial do preço de capa para a compra é realizada com a editora.
Os livros físicos da Coleção Leia para uma Criança 2021 poderão ser solicitados a partir de 1o. de outubro pelo site da campanha. Os livros digitais estão disponíveis aqui.
A coordenadora da campanha, Dianne Melo, respondeu a três perguntas enviadas pelo editor da Quatro Cinco Um, Paulo Werneck, sobre o novo edital. Desde 2017, o Itaú Social apoia a cobertura de crítica de livros infantojuvenis da Quatro Cinco Um.
Como surgiu a ideia de trabalhar com as culturas indígenas e afro-brasileiras neste ano?
É preciso reconhecer os importantes desafios que tocam a sociedade brasileira no que tange às desigualdades sociais, sobretudo étnicas e raciais, e acreditamos no potencial da literatura para atuar na diminuição dessas desigualdades.
Nos últimos anos, especificamente após as leis 10.639/03 e 11.645/08, que tornam obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena, respectivamente, nos currículos nas escolas brasileiras, houve um aumento significativo da produção literária sobre essas temáticas. Porém, desde o primeiro edital Leia para uma Criança em 2017, percebemos que as editoras participantes do processo não inscreviam livros de autoria e/ou temáticas raciais e indígenas. Embora essa diretriz esteja bem evidente nos critérios de qualidade temática da matriz utilizada para a seleção dos livros, apenas 9% dos livros atendiam a esse perfil.
Como o Itaú Social mede o impacto da campanha? Ele seria visível, por exemplo, na recém-publicada pesquisa Retratos da Leitura no Brasil?
O objetivo da campanha é fomentar a mediação de leitura e o fortalecimentos de vínculos entre pais, mães e filhos. É um grande convite à sociedade para participar desse momento tão importante para o desenvolvimento humano que é a primeira infância – compreendida dos 0 aos 6 anos. Nesse sentido, a leitura de bons livros de literatura nesse período permitem às crianças se reconhecerem, compreender tempos e espaços, criar vínculos e construir memórias afetivas por meio da palavra. O uso da literatura como bem cultural é o alicerce para a aquisição da linguagem, para o domínio da língua, para a constituição da identidade e a construção do conhecimento. Aplicamos um survey para as famílias, secretarias de educação, organizações da sociedade civil e bibliotecas comunitárias de modo a compreender os usos e mudanças de práticas no que se refere à mediação de leitura e formação leitora das crianças. Além disso, também mapeamos os dados de alcance territorial das distribuições e o perfil de pessoas que solicitam esses livros. Um dos resultados da recente pesquisa Retratos de Leitura no Brasil, que nos chamou a atenção, foi o aumento de quatro pontos percentuais na proporção de leitores entre cinco e dez anos. Trabalhamos para que a formação de leitores seja cada vez mais uma realidade neste país.
Discussões como a de um novo imposto sobre o livro vêm suscitando o debate sobre as políticas brasileiras para o livro e para a leitura, questão que o Itaú Social abraçou nos últimos anos. Há como mensurar de forma precisa o impacto da leitura e da escrita de qualidade no desenvolvimento humano do país?
Paulo Freire, durante a revolução de Angicos em 1963, já dizia que as pessoas tinham direito a aprender um conhecimento básico (ler e escrever) para poder enfrentar outros problemas da vida. Sabemos que o acesso à leitura e literatura de qualidade ainda é desigualmente compartilhada entre os brasileiros e que a educação e a cultura estão totalmente relacionadas ao desenvolvimento de uma nação. Apesar de todas as dificuldades, continuamos trabalhando para aumentar o acesso dessa literatura principalmente nas famílias mais vulneráveis deste país. Porque é pela linguagem e na linguagem que nos constituímos enquanto sujeitos críticos e coerentes do nosso papel na sociedade. O livro não é um bem material, apenas. Ele é um bem cultural e tem o poder de transformar gerações.
Há planos de diversificar a quantidade de títulos selecionados ou o formato se estabilizou com os dois escolhidos de cada edição?
Durante os dez anos do programa, já distribuímos de dois a três títulos por ano, além de disponibilizar dezenove títulos digitais. Por enquanto, temos a estratégia de distribuição de dois títulos, considerando uma composição temática e diversificada de autores nacionais e estrangeiros. Além disso, por meio de uma distribuição focalizada, temos chegado cada vez mais nos públicos de maior vulnerabilidade socioeconômica.